quarta-feira, 1 de abril de 2009

IKEA: PARQUE DAS CIDADES VERSUS CAMPINA DE BAIXO ?

Li com atenção – e distância crítica – o artigo publicado no “Correio da Manhã" em 30 de Março de 2009. Em grandes parangonas, o título do artigo diz: “Maior IKEA ibérico nasce em Loulé“. Refere ainda o artigo que se pretende implantar este grande IKEA junto do Parque das Cidades, havendo duas localizações referenciadas.
Quem anda nestas coisas sabe há muito que se fala deste investimento.
E sabe também que a primeira localização na “calha“ estava nas ou perto das encerradas instalações da Unicer (Campina de Baixo).
O assunto interessa-me em particular sob o ponto de vista urbanístico: estas três putativas localizações surgem apenas e só em resultado de escolhas meramente tecno-comercias dos investidores (e intermediários) ou são o resultado de uma visão estratégica para desenvolvimento do Concelho e da Região, nunca perdendo de vista o correcto ordenamento do território ?
Comecemos pelas localizações.
À escala regional, ambas me parecem perfeitamente equivalentes no que a acessibilidades se refere: qualquer das localizações é servida com a mesma proximidade por nós viários que ligam directamente à Via do Infante.
Ainda à escala regional e supra-regional (leia-se conquistar mercado do sul de Espanha) a mesma equivalência não torna uma localização melhor que a outra.
Agora, no que se refere à competitividade entre concelhos, as lutas já começaram. José Apolinário (actual presidente da Câmara Municipal de Faro) defende que este novo IKEA deveria implantar-se a sul do Estádio Algarve, em terrenos que pertencem à Associação de Municípios de Loulé / Faro.
Tanto quando sei, Seruca Emídio (actual presidente da Câmara Municipal de Loulé) estará mais “virado“ para que este empreendimento se localize a poente do Estádio Algarve, em terrenos incluídos (logo geridos) apenas no concelho de Loulé, mais precisamente nos Caliços, freguesia de Almancil.
Assim, às acima referidas razões tecno-comerciais, juntam-se razões políticas emergentes da sempre latente “ puxar a braza à minha sardinha “.
A este propósito julgo interessante ler a entrevista a Vítor Neto, presidente da Associação Empresarial da Região do Algarve, publicada em 26 de Março último, no jornal “O Algarve“. Entre outras afirmações, sem comentários, destaco uma:
“As autarquias são muito simpáticas, mas cada uma delas pensa em si própria: são 16. Cada uma tenta atrair o máximo para o seu concelho para ganhar simpatias e eleitores. Não têm disponibilidade para uma visão integrada da região“.
Quanto à classificação dos solos, tanto quanto apurei, qualquer das localizações referidas está fora dos perímetros urbanos definidos nos PDM’s. Não bastasse este facto, grande parte dos terrenos referenciados para a instalação do IKEA estão incluídos na Reserva Agrícola Nacional… e estamos a falar de uma área com aproximadamente 45 hectares.
Por tudo o atrás exposto fica a pergunta: será isto Ordenamento do Território com uma perspectiva de desenvolvimento estratégico da Região?

2 comentários:

José Eduardo Sousa disse...

No que á hipotese de conquistar mercado andaluz, é para esquecer, temos um IKEA em Sevilha com preços abaixo da tabela portuguesa. Devemos ser mais ricos, por isso tudo é mais caro por cá...

Como bem sabes, eu de arquitectura e engenheria não percebo nicles. Mas tenho outros predicados. Por exemplo, creio que para o comércio tradicional de qualquer concelho (da malta que vende loiças, abajours, moveis, etc) vai ser catastrófico. Tá á vista. quanto aos tão apregoados três mil empregos, bem, ia caindo da caderia quando vi o numero, pensei depois que seria uma gralha. Não era, era mesmo areia para os olhos. Desafio-vos a reflectir sobre o numero, é impossivel criarem três mil postos de trabalho. Nem com duas lojas e duas fábricas lá chegavam.

Temos depois que perceber o que é isso dos empregos criados. Serão empregos que pagarão na sua maioria ordenados de quinhentos e seiscentos euros. Com elevada precariedade. Claro, para vender aos preços que practicam, os ordenados não podem ser grande coisa. Que a prazo vão gerar muito desemprego, isso é de certeza. Chamo a estes projectos os "empreendimentos eucalipto". Secam tudo á volta e deixam a comunidade mais pobre. Sempre. Claro que quem aprova estas coisas vive á conta do erário publico e com emprego garantido, não lhes faz grande diferença, querem é comprar estantes a dez euros que ainda por cima lhes garantem entretenimento a partir das 16.30, hora a que largam o tacho e podem divertir-se a montar aquelas coisas giras. Faz bem ao ego.

Estas coisas provocam a falta de circulação de pessoas, a mudança de hábitos e a quebra da circulação de dinheiro dentro da comunidade, muitos outros negócios de sustentação de famílias e emprego local desaparecem. O desemprego instala-se , as pessoas são obrigadas a aumentarem os custos do funcionamento familiar, procurando emprego fora, com repercussões no orçamento e na homogeneidade familiar e educativa.
Passando a trabalhar, a comprar e a fazer amigos noutros círculos, tudo vai mudando na estrutura funcional das localidades. Perdem o convívio, a discussão, a cultura, a renovação e a fiscalização, suportes ancestrais do desenvolvimento. Minguam os locais e altera-se a sua História, a correlação de forças fragiliza a segurança, o ensino e a saúde, aparecendo os argumentos dos custos dos serviços para justificar os encerramentos. Com a falta de oportunidades locais, muitos partem para outras paragens, indo alimentar a concentração e a especulação imobiliária.

Quando se fala da perda de 4 empregos por cada um criado nos grandes espaços comerciais, não se contabilizam todos os outros danos, muitos deles irreversíveis na estabilidade emocional, na poupança e na qualidade de vida.
As leituras economicistas que os políticos fazem para estes casos, assemelham-se aos estragos provocados pelos PIN, que de uma forma pouco clara e justa, contornam os PROTAL e PDM, os mesmos que são agitados para impedirem filhos e netos, de construírem nos terrenos de família ou mesmo, a instalação de empresas que empregam e puxam pela economia local. Já para não falar que esta malta pouco retorno traz á região, são multinacionais sediadas noutras comunidades, onde será com certeza reinvestido o lucro dos negócios realizados noutras paragens, que apenas funcionam como financiadores.

Quem defende estes espaços, sobrepondo o aspecto emprego e não suscitando a discussão aberta, são os mesmos que falam de combate à desertificação e das diferentes visões alaranjadas e rosadas, das polis humanistas.

Só temos o que merecemos é certo, mas já vai sendo altura de pensarmos em mudar de paradigma de decisão. Claro que isso seria perigoso, mas a qualidade dos nossos decisores tem de mudar. Têm de passar a ser pessoas com noção do que custa a vida, do quanto cansa ganhar o pão de cada dia, de quanto custa o trabalho. E têm de ser apaixonados, ter paixãos pelas suas cidades, vilas e aldeias. Mas isso será uma discussão que fica para as calendas.

Cá por mim, ficávamos bem servidos com o IKEA de Sevilha, que é longe o suficiente para não fazer grande mossa...

Salam Aleikum

João Pedroso disse...

Caro José Eduardo
Concordo com o que dizes e acrescento: ocupar o território com base em critérios meramente economicistas é, normalmente, desordenar. E daqui a alguns anos talvez os meus filhos perguntem: " quem foram os tipos que plantaram aquele mono ?"
Grande abraço.