terça-feira, 2 de setembro de 2008

AINDA ESPANHA

O sector da construção em Espanha vai mal.
Vai seguir-se o resto da economia.
Espanha teve nos últimos anos 10 anos um dinamismo elevado para o qual contribuiu um forte investimento em construção e em toda a actividade imobiliária: construção e desenvolvimento de projectos, comercialização, financiamento, actividades complementares (por ex. decoração), etc.
Esta história é conhecida e também se sabe que já acabou. Agora está tudo do avesso.
Da mesma forma que a expansão económica veio a par e suportou o imobiliário, agora, com menos dinheiro no bolso, e com a economia a crescer muito menos, o imobiliário espanhol sofre.
O que se passa?
Quando as pessoas sentem aumentos continuados na sua riqueza imobiliária –quando o preço do seu imóvel sobe mais do que a média dos preços – ajustam para cima os seus níveis de despesa, ou seja, sentem-se mais ricas e gastam mais. Por isso é que normalmente o aumento dos preços da habitação anda a par com o aumento do consumo.
Estes efeitos não têm nada de irrelevantes porque o imobiliário é um sector com muito peso e também porque a riqueza imobiliária é uma parte significativa da riqueza - dos activos - de uma família e um impacto sobre essa componente tem efeitos poderosos e prolongados sobre o comportamento das famílias.
O que vai acontecer agora em Espanha é a queda do imobiliário pressionar para baixo o consumo e o ritmo económico o que por sua vez vai agravar a situação no imobiliário. Entra-se num círculo vicioso descendente para que os desequilíbrios se reduzam.
Os proprietários vão sentir o seu património desvalorizado e vão ajustar as despesas tendo em conta esse novo valor. Isso não acontece se se pressente que essa queda dos preços é temporária e que dentro em pouco tudo volta a ser como dantes. Infelizmente há pouca convicção de que esta seja a versão que vai vingar. Por isso, os consumidores espanhóis vão controlar muito bem as suas despesas nos próximos tempos. A actividade está em queda, o desemprego a subir e o rendimento disponível vai ressentir-se.
Mas nestas coisas não há só quem perca. Quem não tem património imobiliário ou se esse património é insuficiente – por exemplo, famílias jovens que querem comprar casa pela primeira vez – vai encontrar imóveis disponíveis mais baratos. Do mesmo modo, os inquilinos podem ter possibilidade de ver controladas as rendas, nomeadamente, por via do aumento da oferta de casas para arrendar.
Este é um dos mecanismos económicos que pouco a pouco vai tender a repor alguma normalidade no mercado imobiliário. Por outro lado, diz-nos quais podem ser as áreas do imobiliário espanhol que se podem manter à tona de água: o arrendamento e a procura inicial das famílias jovens. Pode tentar-se ajustar a oferta a este tipo previsível de procura: pequenas tipologias, casas com soluções modernas, com boa envolvente urbana, etc. Será isto?
Então e nós?
Em Portugal este boom dos imóveis nos últimos anos não aconteceu.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE) entre 2000 e 2006 o valor dos prédios urbanos hipotecados (Continente) subiu 5,8% ao ano. Uma taxa moderada.
Isto foi assim porquê? Porque andamos em dieta desde 2000. O nosso crescimento tem sido muito baixo, os salários não sobem, estamos a digerir as dívidas contraídas nos anos de viragem do século e as finanças do Estado estiveram pelas ruas da amargura. Por causa da dieta rigorosa de vários anos podemos ir a banhos neste Verão de 2008 em melhores condições do que os gordos dos espanhóis. Somos mais pequeninos que eles mas estamos agora menos gordos. É caso para se dizer bendita dieta!
Ainda assim convém por umas velinhas a São Trichet – o sr. do Banco Central Europeu – para que as taxas de juro baixem e baixem com elas os nossos encargos com a dívida à banca. Em Junho e segundo dados do Banco de Portugal, os particulares deviam à banca 132 459 milhões de euros e o crédito de cobrança duvidosa era cerca de 2%. O endividamento tem continuado a subir de ano para ano mas tem abrandado.
O que se passa em Portugal e em Espanha é também um processo de aprendizagem por parte das famílias e das empresas sobre tomada de decisões em ambiente de taxas de juro baixas e de câmbios fixos (na Zona Euro). Isto é, o euro veio criar novas regras que todos vão ter de aprender, se possível, sem dor. Temos de sentir que dinheiro fácil e taxas de juro baixas não é equivalente a acabaram as dificuldades. As dificuldades não desapareceram foram apenas trocar de roupa.
Nós já começámos a aprender a conviver com dinherio fácil e taxas de juro baixas. Os espanhóis vão também ter de decorar esta tabuada.
Luis Rosa

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